Estive ausente, mas foi por uma boa causa, viajei por esse Brasil e acabei conhecendo várias pessoas, com várias histórias ótimas.
Hoje vou contar a história de Ana, a menina que foi na palestra e aprendeu que ser pobre é mais do que não ter dinheiro. É um estilo de vida!
Ana e Alessandra eram amigas desde a época que trabalhavam juntas num lugar de semi-escravidão. Ambas eram da área gráfica, cada uma com sua especialidade. Você acha que diploma conta alguma coisa? Não para a firma que elas trabalharam. Eram chibatadas para todos sem distinção. Ana foi a primeira a sair de lá, Ale só saiu há pouco tempo, meio traumatizada, mas enfim alforriada.
Ambas se interessavam muito pela área que trabalhavam, sempre buscavam as novidades do mercado, para se aprimorar e, quem sabe, sair daquela firma de escravidão. Depois que saíram da firma, continuaram na batalha para melhorar a mão de obra. Foi quando souberam de uma palestra gratuita sobre a área gráfica e editorial. Que mamata! Ale logo inscreveu-se e convidou a amiga Ana, que topou, afinal, era de graça e tinha certificado.
As duas saíram de seus respectivos empregos correndo para pegar o início da palestra, viram tudo e a parte que interessa é a que começa depois da palestra. Rolou uma boca livre pro pessoal, bebidinhas alcoólicas e não-alcoólicas. Tinha quiche, canapés, toda aquela comida pseudo-chic que rola em palestras pagas estava rolando de graça naquela palestra. Suspeito para mim, mas para as meninas era a felicidade concreta. A verdadeira alegria de pobre.
Comeram tudo que sabiam e o que não sabiam que era. Pegaram um guardanapo, encheram de salgadinhos, enrolaram e colocaram na bolsa, pra comer mais tarde ( e claro que todos que estavam lá também estavam fazendo isso, afinal, era DE GRAÇA!), beberam todos os champagnes e vinhos que passavam. Estavam trilegais quando chegou o mestre da festa, bateu três palminhas e gritou “acabou a mamata pobraiada, podem ir embora!”.
E as meninas foram super alegres para o metrô, bêbadas de vinho e champagne de origens duvidosas. No meio do caminho, Ana sentiu seu estômago doer muito, Ale ficou preocupada, mas Ana disse que iria embora bem. Saio do metrô e foi pegar o trem pra São Bernardo, onde mora. No trem, Ana não encontrou lugar para sentar, ficou zonza e começou a vomitar ali onde estava mesmo, no meio do corredor. Na estação próxima o trem parou e a galera botou a vomitada para fora do vagão, assim, arrastada, pois ela vomitou e desmaiou (digno de Janis Joplin isso). Um guardinha viu a moça caída e foi lá ajudar. Pegou o celular dela e procurou o numero CASA, ou MAE, ou PAI, tentou ligar mas estava sem crédito, então ele ligou a cobrar mesmo. “Oi aqui é o Guardinha, achei a moça caída aqui na estação”, disse ele. “Meu Deus minha filha foi seqüestrada”, gritou a mãe de Ana – “quanto é o resgate, onde? Eu não tenho dinheiro, moço, ai ai meu coração” – completou ela.
O guardinha, envergonhado pela mãe de Ana, explicou que não era nada disso, que a menina estava passando mal e a ambulância a levaria para o Hospital Publico, onde eles deveriam estar caso ela falecesse. Desfeito o mal entendido, a mãe e o pai de Ana seguiram para o Hospital, mais aliviados pois não teriam que roubar para pagar um resgate de seqüestro.
Ana acordou na ambulância, olhou para o enfermeiro, que perguntou “vc bebeu o que? Fogo Paulista?”, ela retrucou “eu comi essas bostinhas aqui que tão na minha bolsa” e mostrou os salgadinhos que roubara da palestra. O enfermeiro não acreditou que tenha sido a comida, e nem o medico, quando foi atendida, mas quando o médico viu a cara da mãe de Ana, resolveu limpar a barra dela e disse que era intoxicação alimentar. A mãe dela acreditou e Ana viu que as vezes uma injeção na testa pode ser mais legal que uma boca livre de graça.
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